Um feliz sorriso para todos
Vivemos de e para sorrir.
O segredo da vida poderá muito bem ser o manter da capacidade de sorrir, mesmo quando tudo o resto se encontre, a ruir. Contentamento local, despreocupação global. Sorrir.
As bolhas da felicidade contemporânea constroem-se com a plena ocupação do tempo e espaço mental. 8h para repouso onírico, 2h para refeições a correr, 10h para deslocação e ocupação laboral, que não sendo na sua maioria particularmente deleitosa, proporciona os rendimentos necessários à vivência pretendida no remanescer do tempo de vida.
Sobram assim 4h por dia e dois dias por semana para ocupação "livre".
Normalmente alicerçada numa aprazível sensação de dever cumprido, opta-se por desfrutar dos prazeres da vida. Sorrir. O que se traduz em festins gastronómicos, aquisição de bens materiais e o garantir de um contínuo e imparável fluxo de entretenimento, geradores de uma paz hipnótica. Este fluxo é essencial à endorfina, transmutadora do sentimento e pensamento holístico no mórfico do jumento. Sorrir.
Viver para sorrir, registar e partilhar esse sorriso, o próprio e o dos nossos, sem medir consequências. As notícias de calamidades extremas, desvalorizadas por vivermos em pontos centrais, as suas causas relativizadas por não sermos pessoas de extremos, consequências esquecidas por termos a capacidade de, na nossa bolha, sorrir e fazer sorrir.
Hoje teremos mesas e oferendas fartas cujo propósito principal é sobretudo o de nutrir esta corrente de sorrisos. Escondidos, na cadeia de produção deste momento, ficam todos os factores que, se aceites e tolerados, conduzirão à destruição sucessiva, de mais e mais bolhas de felicidade, até ao dia em que todos serão as notícias. Sorrir.
Há os que não querem saber, há os que sabem mas não acreditam que se pode mudar, há os que passam a saber e actuam. Hoje todos estarão misturados. Talvez não se fale disso. Porque hoje é um dia para... sorrir. Talvez num outro dia. Entre uma série, um filme, um jogo de futebol, uma ida ao supermercado, um churrasco. Talvez. Se os sorrisos deixarem.
Hoje é um dia feliz, com custos infelizes. Cuidado com a ilusão do sorriso vital pois ele é também um voraz sorriso fatal. Hoje sorria-mos. Mas por favor, amanhã, amanhã conversemos, seriamente, sobre o nosso presente, sobre o nosso futuro. Sorrir.
terça-feira, dezembro 24, 2019 | Etiquetas: Crónica (ou género disso) | 0 Comments
I Am
I am an human being
[question mark]
I am an human being that can visit the forest.
I am an human being that cannot survive the forest.
I am an human being that does not eat brOther animals.
What would I eat?
What would I drink?
What would be my shelter?
How long would it take ME
to evolve
to my primordial state?
As the broken horse becomes a strong stallion.
As the gentle pig becomes a wild hog.
What
am
I?
quarta-feira, junho 27, 2018 | Etiquetas: Poesia? | 1 Comments
A Buja de Ti'Bordão
Ao pôr do sol, no final de mais uma labuta, todos os pastores se concentram no Monte dos Cercados, ateando fogueira, preparando púcaros, abrindo canivetes, antecipando um merecido repasto antes da sua entrega à soporífera noite estrelada, cada um ladeado pelos seus fiéis ovelheiros.
Do cimo observam entretidos um dos momentos mais divertidos da sua rotina. A chegada de Ti'Bordão, acompanhado de Capitão, Buja e seu rebanho. Ti'Bordão não é nome é alcunha, em reconhecimento da sua idade, da sua experiência, do seu saber, do seu sabor. Sendo o mais antigo dos pastores era tratado como se fora um tio de todos a quem muito ensinara, tantos quilómetros acumulados tinha em suas rijas pernas que mais parecia ser o seu cajado que nele se apoiava para aguentar a passada nas longas distâncias.
Ti'Bordão era sempre o último a chegar. Primeiro as suas ovelhas, tilintantes, dispersas, iniciavam a subida de forma caótica como que crianças procurando adiar o toque de recolher. Até que se ouvia uma voz de trovão!
- "CAPITÃO! ARREBANHA-ME ESSAS OVELHAS DE UM CABRÃO!"
(logo depois Ti'Bordão diz em surdina, de forma meiga: "Buja, quieta, juízo.")
Todos os pastores, bem como seus ovelheiros e ovelhas já acolhidas, ficavam em sentido com tamanha voz de comando. Já Capitão, um majestoso Castro Laboreiro, de olhar sagaz, cumpria com mestria, primeiro recuperava as tresmalhadas, depois agrupava-as num rebanho que mais parecia um único organismo de tão junto, de tão síncrono, tudo isto por pura imponência, sem um único latido.
Depois de impressionados todos os pastores esboçam um sorriso de deboche, antecipando o ridículo do próximo momento. Normalmente é quando tudo está encaminhado para um recolher simples e eficaz que Buja entra em acção. Buja é uma jovem cadela de fraca reputação, sem raça, de olhar tresloucado, com graves problemas no entendimento. Buja quase não pode ser considerada uma ovelheira. Adequa-se mais um estatuto de ovelha especial com alguns privilégios mais do que as ditas. Seja como fôr há algo na ordem instituída que a perturba profundamente pelo que repentinamente parte em velocidade de ponta, ziguezagueando de encontro ao coração do rebanho. As ovelhas ficam atarantadas iniciando-se a dispersão, Buja passa sobre, sob, entre elas, aparecendo e desaparecendo por entre os seus corpos felpudos, por vezes não calcula bem a distância vendo-se mesmo alguns cordeiros a voar. Capitão desespera, perde a compostura elegante, late, rosna, tentando restituir a ordem de forma intimidante. Os pastores entretidos gargalham.
Já Ti'Bordão trovão novamente
- "BUJA! AH SUA PUTA! AQUI JÁÁÁÁÁÁÁ!"
Um atento Capitão interpela a azáfama de Buja com um laber de focinho ternurento, esta volta a si, orgulhosa de seu nome estar no que parece ser uma frase de comando, apressa-se a chegar aos pés de Ti'Bordão espojando-se de barriga para cima, cauda a dar a dar, como que esperando uma recompensa merecida pelo seu melhor trabalho possível. Enquanto Ti'Bordão a afaga Capitão volta a fazer o que tem de ser feito, aproveitando a distracção de Buja, reagrupa e encaminha o rebanho ao seu cercado.
Juntando-se aos seus colegas, ainda de cara húmida das lágrimas que choraram de tanto rir, Ti'Bordão é interpelado por um deles.
- "Oh Ti'Bordão, não sei como você aguenta. Todo o santo dia a mesma coisa. Está visto que essa cadela não serve para nada. Só lhe dá despesa e trabalhos. É dar-lhe uma bordoada nos cornos e tentar com outro. Pode ser que tenha a sorte de lhe sair outro Capitão."
Ti'Bordão não levou a mal. Também ele quando mais jovem, menos vivido, se regia por outros valores. Olhando para todos aqueles seus colegas de bronze fundido na pele, agredidos pelos elementos, envolvidos pela rude solidão do campo, regidos pelos ditames do sol e da terra, disse-lhes:
- "Na imensidão deste nada que absorve toda a nossa vida a Buja mostrou-me servir para algo essencial para mim e Capitão. De forma irritantemente inexplicável, dia após dia, do primeiro ao último quilómetro, Buja faz o inesperado, consegue quebrar o nosso pranto fazendo-nos rir, coisa que desvalorizava por não se suceder antes dela se juntar a nós."
Os pastores fecharam o sorriso, não mais abordaram o tema nessa noite. Já deitados, vários deles ponderam seriamente se quando Buja tiver uma ninhada Ti'Bordão lhes teria a amabilidade de oferecer uma cria. De preferência a que aparente ser mais tonta e inútil.
domingo, outubro 15, 2017 | Etiquetas: História Curta | 0 Comments
Asdrubal, o Girassol
Felizmente a autoria da História permite flexibilidade na fidelidade do seu relato. O percurso até aqui foi glorificado como conveio, omitindo-se tudo o que teve de vergonhoso e censurável. O mais importante é que se atingira o sucesso. A humanidade tornou-se capaz de subsistir exclusivamente via um novo processo biológico de fotossíntese.
O único senão é o facto desta fotossíntese recém-adquirida ser algo lenta, obrigando a largos períodos de exposição solar. Facto que levou à reformulação da arquitectura para potenciar ao máximo a exposição solar, criando-se também uma nova indumentária universal muito aproximada à utilizada em zonas balneares, o que de certa forma veio trazer enorme beleza estética à Humanidade uma vez que o corpo humano, qualquer que ele fosse, era agora digno de ser admirado.
Para sobreviver Asdrubal era assim obrigado a constantemente posicionar-se de acordo com a orientação solar por forma a garantir plena exposição da sua única parte funcional. Para seu infortúnio rapidamente passou a ser mundialmente conhecido como o estranho caso de Asdrubal, o Girassol.
terça-feira, agosto 15, 2017 | Etiquetas: Devaneio, História Curta | 0 Comments
Salvaterra-te
O FDS passado passei-o em Salvaterra do Extremo no festival Salva a Terra. Fui por impulso, sem ligar a programa do festival, voluntariei-me para ajudar na organização, e para além de pessoas puras conheci um espantoso Parque Natural do Tejo Internacional ao qual irei um dia regressar para valentes caminhadas.
O ambiente inspirador provocou em mim um alto débito de micro-pensamentos desconexos resultantes do olhar, escutar e sentir toda a envolvência humana e natural.
Aqui ficam alguns para registo e partilha.
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Sempre que Eu
Tu
Sempre que Tu
Eu
Sempre
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O lobo mau contemporâneo é o soprador de folhas.
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No passado, ao abandono do método tradicional chamou-se inovação. No futuro, ao retorno do método tradicional chamar-se-á inovação. O presente é mero desperdício residual.
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De nada adianta o acordar matinal quando o viver é tarde demais.
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"Eu não sou de ferro" lamenta-se a vergada estátua de latão.
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Lutar contra o Universo é o viver no seu reverso.
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Tudo o que é preciso para tornar os outros felizes é ser-se um bom taberneiro.
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Apesar do riso dos outros o riso supremo é posse do louco em cuecas.
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A velocidade da vida é melhor entendida quando a condução das suas rédeas é feita por um cão idoso.
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Continuarás a sentir-te perdido enquanto a tua boca falar mais do que o teu olhar.
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Mais do que ensinar as crianças a lidar com o monstro debaixo da cama deveríamos alertá-las para os perigos do monstro que dorme em cima da cama.
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Não raras vezes o emprego é o trabalho organizado executado por pessoas caóticas e o voluntariado é o trabalho caótico executado por pessoas organizadas.
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Aparentemente ter filhos é fácil quando se é despojado de tudo o resto. Do nada ter, tudo se obtém, sendo o próprio Universo prova disso.
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Aninha-te como um pássaro, persuade como um gato, defende como um cão, fazendo-te assim um bom homem.
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Não percas tempo a tentar encantar um bruto. Fascina-te antes pelo encanto que também nele reside.
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No campo existem tantas espécies de sombras como espécies de árvores.
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Os idosos tragam a vida da juventude saboreando a qualidade da sua sementeira.
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A melhor maneira de manter amizades é ser-se gentil para com forasteiros.
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Cria as tuas crianças como animais, com pouco mais que afecto, ração, água, e arrisca-te a que elas sejam livres e felizes como animais.
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Pro-bono deveria significar que toda a remuneração foi gasta ao conseguir reunir as condições necessárias para o garantir de uma excelente performance.
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Se ao viajares te sentes confortável em lugares estranhos, demoras a ter saudades, então já terás percebido que a tua primeira casa és tu.
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Não persigas as lições de quem detém o conhecimento. Recebe-as de quem o tem, partilhando-o espontaneamente.
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Por vezes quando és abordado num mar de estranhos deverás ter a sabedoria de te deixares embarcar aproveitando a viagem.
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A vida que passa
A morte que chega
Antípodas falsas gémeas
Siamesas
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No corpo tela
A vida é aguarela
A tatuagem é fábula
A cicatriz é rábula
A ruga é escória
O todo é história
segunda-feira, junho 26, 2017 | Etiquetas: Devaneio | 0 Comments
Trinca
Poesia na ponta da língua
Entusiasmado ... dentei-a
Uma trinca de dor e apneia
Sangue em boca à míngua
Poema ceifado
Poeta desesperado
Tentei os neurónios
Que assombrados por demónios
Me entregam peças travessas
De outros enigmas, reprimidos à parte
Num tetris de estigmas. amontoado sem arte
Remexer com pinça
Entre casos de amor
Entre casos de piça
Entre drama e horror
Poeta desolado
Poema poetizado
domingo, maio 28, 2017 | Etiquetas: Poesia? | 1 Comments
Passeio serrano
A flor floresce
O insecto urge
O pasto cresce
O bovino muge
A árvore cortiça
A ave aninha
O vento atiça
O pinhão pinha
A água corrente
A pedra escalda
O cágado contente
O caminho balda
O caracol lento
O tempo ... tempo
O jumento passa
A serra esgueira
O jumento caça
Bala traiçoeira
Animal ferido
Vida morta
Pena torta
O poema ... perdido
domingo, maio 21, 2017 | Etiquetas: Poesia? | 0 Comments
Caminhada da Via Algarviana
Em Abril de 2017 caminhei os 300 km da Grande Rota Via Algarviana e uma vez que não encontrei muitas referências de pessoas que o tenham feito irei aqui partilhar a minha experiência pessoal para que futuros caminhantes possam retirar algumas dicas e melhor preparar a sua aventura.
Dicas Globais
O tipo de piso é maioritariamente terra rija ou rocha recortada, normalmente em caminho com dois metros de largura utilizada para acessos a exploração florestal e apagar de fogos. Existe muita pedra solta que cortam a estabilidade do pé, em alguns locais gravilha profunda. Só uma pequena parte será em via asfaltada ou trilhos apertados.
Pessoas
A uns 8 km de chegar a Silves apanhei um Holandês de 20 e poucos anos que fazia a via Algarviana no sentido contrário. Trazia tenda consigo tendo a flexibilidade de pernoitar em qualquer ponto. Estivemos meia hora na galhofa a trocar dicas sobre os caminhos futuros. Só tinha consigo garrafas para um litro de água, dizia que as enchia pelo caminho. Estava já todo ressequido e tinha 10 km até à fonte de água mais próxima. Avisei-o de que dali para a frente a água não era propriamente potável e dei-lhe meio litro de água, aliviando meio quilo de peso, já que me faltavam duas horas de caminho e a ele provavelmente umas seis.
Em Barão de São João uma senhora mete-se comigo em português, pensei que tivesse uns 60 e picos, tinha 73, holandesa, vivia cá há 20 e tal anos. Queria rodar o português, disse-me que o caminho que eu ia fazer no dia seguinte era muito bonito e que ela própria o fazia de vez em quando porque eram só umas 4 horas de caminhada.
Por fim quando me arrastava entre o Cabo de São Vicente e Sagres sinto uma passada fortíssima atrás de mim, uma alemã robusta, de 50 e picos, que também ia para Sagres, juntou-se a mim e fomos falando o que me fez esquecer a falência física em que me encontrava. Tinha tido uma carreira ao mais alto nível como controladora financeira de um grande grupo alemão, até que há poucos anos achou que isso lhe estava a roubar o tempo de vida, devido à responsabilidade e disponibilidade exigida. Deixou esse emprego conseguindo mesmo assim uma posição confortável como auditora externa para trabalhos ocasionais. Visitou Sintra onde por acaso viu a brochura da rota no Alentejo, 260 km que partem de Santiago do Cacém com junção da rota histórica e da rota de costa Vicentina. Nunca tinha feito trekking na vida, arriscou. Adorou a experiência e diz que vai voltar para fazer a rota Algarviana pois perdeu-se tendo ido parar a Marmelete tendo gostado muito da zona apesar da maior dificuldade do percurso. Ficou maravilhada com a hospitalidade dos portugueses tendo-se entendido às mil maravilhas até com os seus anfitriões que não falavam inglês. Dei-lhe dois xicorações de despedida pela companhia e alívio que me fez aos kilómetros finais, deixei-a na paragem para Lagos e segui para a praia.
Posto estas dicas e partilha de experiências sigo agora para a caminhada em si que é o que interessará mais aos que projectam fazer esta grande rota.
Dia 1 - Alcoutim - Balurcos - Furnazinhas = 40 km
Dia 2 - Furnazinhas - Vaqueiros - Cachopo = 35 km
Existe um alojamento 4 km antes de chegar a Cachopo, eu pernoitei mesmo em Cachopo em quartos disponibilizados pelo restaurante "Retiro dos Caçadores". A dona Olímpia e seu marido fizeram questão me fazer companhia ao jantar falando sobre os velhos tempos e os novos tempos daquela zona.
Dia 3 - Cachopo - Barranco do Velho = 30 km
Dia 4 - Barranco do Velho - Salir - Alte = 30 km
Mesmo antes de Alte há um local onde fica confuso para onde é o trilho, induz mesmo em circulo, o caminho é subir a serra em frente com piso de gravilha branca. Há depois uma parte de trilho apertado que parece entrar em mato denso, é mesmo por aí, a vegetação é que é vigorosa e cobriu o trilho por não ter a intensidade de utilização que o impeça. Em algumas zonas usei o bastão quase como catana para afastar o mato.
Dia 5 - Alte - São Bartolomeu de Messines = 20 km
Dia 6 - São Bartolomeu de Messines - Silves = 30 km
Atenção que quando estão a fazer os 10 km ao largo da reserva de água vai haver um ponto em que dois cães vos vão 'atacar'. São de uma das casas junto ao trilho, não existe escapatória, ou se avança ou se recua ou se espera que apareça o dono para resolver. São cães de uns 25 kg cada bastante atrevidos. Caminhei de marcha atrás usando os bastões cruzados para servir de barreira e chegaram-se a um dedo dos mesmos a ladrar/rosnar.
Dia 7 - Silves - Monchique = 30 km
Dia 8 - Monchique - Marmelete = 15 km
O Restaurante "Sol da Terra" oferece quartos porreiros sendo que ficam nas traseiras da taberna podendo ser algo barulhento, depende da bebedeira dos clientes. Se forem muito sensíveis a barulho para conseguir adormecer tentem a casa de acolhimento do povo que é gerida pela dona do restaurante que fica em frente à caixa multibanco.
Dia 9 - Monchique - Bensafrim - Barão São João = 35 km
Dia 10 - Barão São João - Vila do Bispo = 25 km
Dia 11 - Vila do Bispo - Cabo São Vicente - Sagres = 22 km
sexta-feira, maio 05, 2017 | Etiquetas: Trekking | 0 Comments
Vidas Particulares
No maior acelerador de partículas conhecido, o circuito da existência, são disparados a alta velocidade, em todas as direcções, milhares de milhões de fachos de partículas de vida. Dividem-se em três grupos. As partículas solitárias, que percorrem rapidamente todo o circuito sem se cruzar com nenhuma das outras. As partículas estacionadas que entendem suspender a sua rota à primeira colisão frontal, pois a inércia exige muito menos esforço que o movimento perpétuo. E por fim as partículas propulsoras.
A partícula propulsora é a génese do sistema, é ela que o enriquece com a sua complexidade, tornando-o interessantíssimo de observar. A partícula propulsora tem uma dinâmica muito particular, apresenta velocidades diferentes em momentos diferentes, sendo capaz de impôr desvios não só à sua rota original como à rota de todas as partículas que dela se aproximem, conseguindo mesmo a proeza de impelir movimento renovado em partículas estacionadas. Uma partícula propulsora sente-se sobretudo atraída por partículas de natureza distinta, que a abismem, repelindo partículas de natureza demasiado similar, que se limitam a ser um seu reflexo.
Sempre que uma destas vidas propulsoras se envolve com uma outra vida, ambas espiralam vagarosamente, interseccionam-se, colidem, procurando concertar um novo rumo que sirva a ambas. O ponto crucial é o momento em que se enfadam do espiralar. Aí chegadas é iniciada uma delicada negociação, que tanto se pode revelar um elegante duelo de esgrima olímpica como um sangrento duelo de espadas medievais. Os argumentos dividem-se em duas categorias. Os do sagrado coração contra os da estupidez da razão. Os idílicos e belos argumentos do coração vêem-se muitas vezes esmagados pela estupidez dos argumentos da razão, que, por muito que custe, não deixam de ter o que são. No final dá-se o embainhar de línguas estando encontradas as novas rotas de duas partículas.
No final deste processo qualquer uma destas partículas se pode transformar numa solitária, estacionada ou disparar a alta velocidade em nova direcção, mantendo a sua propulsão. Com um pouco de sorte seguem paralelas, lado a lado, à mesma velocidade, tornando possível observar a olho nu o traçado das mais belas trajectórias de vida.
domingo, março 26, 2017 | Etiquetas: História Curta | 0 Comments
O abismar da fé
Roçando o abismo encontra-se abismado um pároco ímpar, com coração vago de amor, divagando sobre um mar de vagas cheias, do mesmo sal de suas lágrimas salteadas.
Agarrando a corda da batina recorda com agrado as leituras deleitadas dos escritos sagrados. Dizem os homens cultos serem escritos plenos de planos ocultos. Será que o melhor esconderijo de significados por entre palavras é a ignorância de quem as lê e delas tece juízo?
São textos e discursos à época inspiradores, ainda hoje sugados por aspiradores à ascensão, que muitas vezes atingem a mera cessão. Algures pelo meio encontra-se este prior, gerindo sua dor, sendo notória a tensão da retenção dos velhos ensinamentos dos evangelhos. É uma apneia difícil pois tudo o que é inspirado mais tarde ou mais cedo terá de ser expirado. A curto, médio ou longo prazo apenas uma ínfima fracção será retida, sendo tudo o resto expelido como se nunca fora lido. Será sempre este o resultado das lições fatídicas sine qua non de qualquer vida empírica.
Ele encontra-se no ponto em que o tempo deixa de existir, o tempo passa a coexistir. Dentro de sua cabeça o que aconteceu está equidistante do que acontece, do que planeia vir a acontecer, milénios separados por escassos milésimos de segundo. Se assim é na sua simples cabeça porque num Universo muito mais complexo também o passado, presente e futuro não poderão coexistir de mão dada?
Ao pensar sobre de quem serão essas mãos repentinamente dá-se o advento de vento, abruptamente brumas abatem-se sobre o abade que, mostrando-se inabalável, bate pés pacificamente e abala.
quarta-feira, setembro 07, 2016 | Etiquetas: Crónica (ou género disso), Poesia? | 0 Comments
Escrito de Fresco porquê?
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